quinta-feira, maio 18, 2006

O POLVO











Enquanto preparamos um texto sobre o Seixal em que afinal o PER/CDH da Flôr da Mata é só a ponta do iceberg para aquela zona de pinhal que vai desaparecer se forem avante os projectos da Autarquia e o novo traçado do IC 32 CRIPS.

Face às multiplas mentiras publicadas pela Câmara, pelo "côr de rosa" que são os projectos no papel e labirintica que é para o cidadão comum a administração e o acesso a documentos publicos de projectos e processos que o afectam, não resisto face à experiência tida com a autarquia do Seixal a publicar o texto chegado por mão amiga e editado hoje no DN:


"Morgado arrasa políticos e magistrados

É um diagnóstico demolidor sobre o (não) combate à corrupção em Portugal: Maria José Morgado critica os "maus métodos de trabalho" do Ministério Público, a falta de vontade política para combater o fenómeno, a demasiada aproximação entre magistrados e políticos, que se verifica com as nomeações para cargos de confiança política e a dependência da Polícia Judiciária (PJ) do Governo, que "abre a porta ao controlo político das investigações". Tudo conjugado faz com que a procuradora-geral adjunta diga que "o combate à corrupção em Portugal está e há-de estar paralisado". O documento em causa é um texto de apoio de Maria José Morgado (que autorizou o DN a citar) a uma intervenção que irá fazer hoje numa conferência internacional sobre agências anticorrupção que decorre até amanhã no ISCTE (Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa). Para enquadrar a sua linha de pensamento, a magistrada fala em "nódulos do sistema" que são "um conjunto de problemas crónicos, cuja interacção mecânica e definida impede não só a resolução de problemas como a sua própria detecção". No interior do sistema de justiça, Maria José Morgado aponta os "maus métodos de trabalho" do Ministério Público, que aliados a uma "desajustada" direcção do inquérito "impedem uma verdadeira direcção da investigação". Por outro lado, critica o poder político e a sua "estratégia de política criminal inconsequente, nebulosa, por vezes paradoxal". E exemplifica: "O combate à corrupção não faz parte das opções estratégicas do Relatório de Segurança Interna de 2005, deitando por terra boa parte da capacidade de ataque ao crime organizado internacional." Segundo Maria José Morgado, "a corrupção na gestão pública quase se legalizou em certos sectores". Mais: a magistrada não entende como é que o Relatório de Segurança Interna não tem uma palavra sobre, por exemplo, a "corrupção municipal". A magistrada considera ainda que a dependência da Polícia Judiciária, "dirigida por pessoas nomeadas pelo ministro da Justiça e da sua confiança política, que pode transformar-se em confiança pessoal e partidária" face ao Governo, "abre a porta ao controlo político das investigações" que pode surgir de modo "indolor, silencioso".

Carlos Rodrigues Lima - DN - 18-05-2006 "

3 comentários:

Anónimo disse...

Há muitos anos, quando pela primeira vez vi o filme “O Padrinho”, uma das coisas que me impressionaram, foi a dimensão “geracional” da história. As acções dos personagens movem-se pela necessidade de perpetuação da “família”, da sua história própria, do seu património e do seu poder, geração após geração. Sente-se constantemente a intenção de passar à geração seguinte o legado da geração presente e das anteriores, e o desejo absoluto que este nunca se desvaneça. Por isso, tudo é feito com um longo, cauteloso e meticuloso prévio planeamento.
Nas acções da vida real, nesta que nos rodeia a todos, consigo observar este tipo de planeamento cauteloso apenas em áreas que são dominadas por aquilo que se poderão chamar “famílias”, precisamente no sentido mafioso do termo. Exemplo: Uma oportunidade de lucro surge, através da construção imobiliária numa zona altamente apetecível, mas nesse espaço potencialmente rentável há uma zona verde, um espaço “inútil”, possivelmente um vestígio anacrónico de quando as pessoas necessitavam, respeitavam e prezavam as suas ligações à terra. O problema surge, então, sob a forma de como justificar a edificação, que se quer rentável, lucrativa, pois apesar desta ser uma zona que serve para “nada”, esta surge como porta-estandarte e exemplo de algumas entidades que são movidas pelo “idealismo” da necessidade de preservação de descampados e arvoredos, perfeitamente “inúteis” a que chamam zonas verdes, agarrados como zelotas à crença da “preservação”, como se fossem estes arbustos e pinhais pandas em vias de extinção (e como se os pandas servissem para alguma coisa...).
No entanto, os que hoje tecem os planos de lucro, foram herdeiros de um património que sabem não ter sido conquistado da noite para o dia. Antes deles outros houveram que semearam o caminho, teceram planos, fizeram sacrifícios e sacrificaram outros, para que fosse hoje deles, o dia de ter o poder, de exercer a influência, e de fazer sacrifícios. Assim, por etapas, cuidadosamente, cautelosamente, fazem planos que darão às gerações futuras (suas gerações, das suas famílias, entenda-se) o lucro que hoje semeiam: Primeiro, mantenha-se o espaço verde, em alguma medida, eventualmente cinquenta por cento, ou dois terços. Arruamentos arborizados e jardins infantis (que poderão nunca ser edificados), podem sempre entrar nessas equações; Segundo, arrase-se o “descampado” e o “arvoredo” e edifique-se sim, mas em nome do “bem social”, para os “pobres” e os “desamparados” da sociedade, pois causas “sociais” têm sempre o poder de suplantar quaisquer outros moralismos “menores”, como os chamados “moralismos ecológicos”; Terceiro, edifique-se então, mas de preferência construções com um prazo de validade “razoável”, ou seja, que não seja para durar sempre. Vinte anos, quinze ou dez de preferência, após os quais, em nome da imperiosa necessidade da “requalificação da qualidade de vida” dos beneficiados dos programas de realojamento, devido a nítida degradação dos “edifícios e equipamentos sociais”, os edifícios serão implodidos, ou demolidos, preferencialmente por uma companhia da “família”; Quarto, no espaço agora liberto, construa-se então, finalmente, o projecto que se queria de início. O tempo que levou a terminar não foi perdido, antes pelo contrário: pelo caminho ficaram a reputação de uma “obra social”, “benemérita”, “humanitária”, piedosamente inscrita nos anais da “família”; Fica ainda a cooperação com os poderes institucionais (outra das famílias, ou simplesmente um ramo aparentado da mesma), frutuosa para ambas as partes, terá ajudado à consolidação, crescimento e perpetuação das mesmas no terreno; Terão ainda ganho os membros da “família” da indústria bancária e da especulação imobiliária (provavelmente “parentes” próximos), porque continuaram a não ver colocada por ninguém a questão de que nunca seria necessária a construção de “habitação social” se, simplesmente, o acesso à compra de casa, não continuasse a ser tão obscenamente difícil; Finalmente, fica a enorme vantagem de que gozam os actos da “família”, quando são executados em termos de longo prazo, que é a inexistência de uma memória colectiva coesa ou bem formada que venha a julgar as acções dos seus membros perante a exploração do património de todos, para edificação apenas do seu próprio. O tempo tudo apaga e a lembrança dos povos é curta. Por isso é que a história se repete, recalcando velhos erros sobre os mesmos temas, cada vez mais desgastados, afundando cada vez mais o mundo num irremediável círculo de repetição e erro. Erros lucrativos, no entanto. Para a “família”, claro está. E já se sabe que no mundo, não há nada mais importante do que ela, a nossa família, por isso, “tudo está bem”.

Anónimo disse...

"Justiça: Magistrada levanta dúvidas sobre independência

A procuradora Maria José Morgado colocou ontem em causa a independência das investigações face ao poder político, frisando que o combate à corrupção se baseia num modelo algo paradoxal: “Como a Polícia é um organismo dirigido por pessoas nomeadas pelo ministro da Justiça, é fácil concluir que as investigações desta criminalidade podem não respeitar integralmente as imposições de independência do poder político.”
A procuradora-geral adjunta do Tribunal da Relação de Lisboa – que já liderou a Direcção Central de Investigação da Corrupção e Criminalidade Económica e Financeira (DCICCEF) – diz que “o combate à corrupção em Portugal está e há-de continuar a estar paralisado” por força da “má política criminal, da falta de estratégia, dos maus métodos de trabalho e da má organização”.

A magistrada falava num encontro internacional no Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE) sobre agências anticorrupção europeias, palco que usou para lançar alguns alertas e tecer duras críticas.

“Portugal corre o risco de se transformar num ‘offshore’ para práticas corruptivas”, disse distribuindo responsabilidades pelo Governo e Ministério Público.

ESQUIZOFRENIA

Sobre Governo, Maria José Morgado disse estranhar “a falta de objectivos políticos anticorrupção. Parece-me até que há uma certa superstição em falar nisso”, ironizou usando a expressão “esquizofrenia” para definir a forma como o poder político encara este tipo de criminalidade.

Classificando como gravosa a omissão das autoridades, a magistrada diz que o combate à corrupção nem sequer faz parte das opções estratégicas do Relatório de Segurança Interna de 2005.

Desta forma se justifica, na sua opinião, “a desorientação reinante na Direcção Central de Investigação da Corrupção e Criminalidade Económica e Financeira da Polícia Judiciária”.

MP SEM DIRECÇÃO

Fala depois em “familiarismos, caciquismos e clientelismos”. Mas não o faz sem explicar: “O poder político teme, porventura, o combate à corrupção porque está demasiado dependente das clientelas e as clientelas por sua vez das decisões do poder político. O que explica a omissão de uma política contra a corrupção.”

Mas as atenções da magistrada estendem-se também ao trabalho do Ministério Público, entidade que descreve como estando incapacitada para reagir. Não consegue detectar e combater o fenómeno, tem maus métodos de trabalho e de direcção e encontra-se desajustado. Não havendo uma verdadeira direcção, diz, “não é possível coordenar a investigação das Polícias”.

"NÃO DIGO QUE É TUDO CORRUPTO"

Apontadas as falhas do combate à corrupção faltava apenas falar dos resultados. Maria José Morgado não se esquivou à resposta: “Não digo que é tudo corrupto e que não vale a pena fazer nada. Digo é que o combate ao fenómeno não atinge os níveis desejados”.

O défice de resultados – uma centena de casos por ano – é estatisticamente inferior ao que seria desejável, diz a magistrada frisando que há acusações e condenações, mas nada comparado com a realidade do fenómeno.

E para ilustrar a sua tese nada melhor do que um caso da vida real. Qual? O de Macau. Pois bem. Corria o ano de 1989. Carlos Melancia, então governador de Macau, recebe um fax da empresa alemã Weidleplan pedindo-lhe que devolvesse o dinheiro pago alegadamente para garantir o concurso da construção do aeroporto local.

Apesar de o concurso ter sido ganho por outra empresa, o Ministério Público acusou Melancia de ter aceite 50 mil contos para favorecer a Weidleplan. O antigo governador foi absolvido em Janeiro de 1994 da acusação de corrupção passiva, mas o caso só viria a terminar em 2004. Do mesmo caso resultaram mais dois processos, um dos quais ainda está em recurso.

Manuela Guerreiro - Correio da Manhã - 19-05-2006"

Ponto Verde disse...

Ao comentador José um agradecimento pela análise profunda e antológica, se me permite vou publicar. Está tudo aí!