sábado, maio 20, 2006

O POLVO 3












O A-Sul pelos seus leitores - foto Flor-da Mata e sugestões DVD para o fim de semana.

"Há muitos anos, quando pela primeira vez vi o filme “O Padrinho”, uma das coisas que me impressionaram, foi a dimensão “geracional” da história. As acções dos personagens movem-se pela necessidade de perpetuação da “família”, da sua história própria, do seu património e do seu poder, geração após geração. Sente-se constantemente a intenção de passar à geração seguinte o legado da geração presente e das anteriores, e o desejo absoluto que este nunca se desvaneça. Por isso, tudo é feito com um longo, cauteloso e meticuloso prévio planeamento.


Nas acções da vida real, nesta que nos rodeia a todos, consigo observar este tipo de planeamento cauteloso apenas em áreas que são dominadas por aquilo que se poderão chamar “famílias”, precisamente no sentido mafioso do termo. Exemplo: Uma oportunidade de lucro surge, através da construção imobiliária numa zona altamente apetecível, mas nesse espaço potencialmente rentável há uma zona verde, um espaço “inútil”, possivelmente um vestígio anacrónico de quando as pessoas necessitavam, respeitavam e prezavam as suas ligações à terra. O problema surge, então, sob a forma de como justificar a edificação, que se quer rentável, lucrativa, pois apesar desta ser uma zona que serve para “nada”, esta surge como porta-estandarte e exemplo de algumas entidades que são movidas pelo “idealismo” da necessidade de preservação de descampados e arvoredos, perfeitamente “inúteis” a que chamam zonas verdes, agarrados como zelotas à crença da “preservação”, como se fossem estes arbustos e pinhais pandas em vias de extinção (e como se os pandas servissem para alguma coisa...).

No entanto, os que hoje tecem os planos de lucro, foram herdeiros de um património que sabem não ter sido conquistado da noite para o dia. Antes deles outros houveram que semearam o caminho, teceram planos, fizeram sacrifícios e sacrificaram outros, para que fosse hoje deles, o dia de ter o poder, de exercer a influência, e de fazer sacrifícios.

Assim, por etapas, cuidadosamente, cautelosamente, fazem planos que darão às gerações futuras (suas gerações, das suas famílias, entenda-se) o lucro que hoje semeiam:

-Primeiro, mantenha-se o espaço verde, em alguma medida, eventualmente cinquenta por cento, ou dois terços. Arruamentos arborizados e jardins infantis (que poderão nunca ser edificados), podem sempre entrar nessas equações;

- Segundo, arrase-se o “descampado” e o “arvoredo” e edifique-se sim, mas em nome do “bem social”, para os “pobres” e os “desamparados” da sociedade, pois causas “sociais” têm sempre o poder de suplantar quaisquer outros moralismos “menores”, como os chamados “moralismos ecológicos”;


- Terceiro, edifique-se então, mas de preferência construções com um prazo de validade “razoável”, ou seja, que não seja para durar sempre. Vinte anos, quinze ou dez de preferência, após os quais, em nome da imperiosa necessidade da “requalificação da qualidade de vida” dos beneficiados dos programas de realojamento, devido a nítida degradação dos “edifícios e equipamentos sociais”, os edifícios serão implodidos, ou demolidos, preferencialmente por uma companhia da “família”;


- Quarto, no espaço agora liberto, construa-se então, finalmente, o projecto que se queria de início. O tempo que levou a terminar não foi perdido, antes pelo contrário: pelo caminho ficaram a reputação de uma “obra social”, “benemérita”, “humanitária”, piedosamente inscrita nos anais da “família”; Fica ainda a cooperação com os poderes institucionais (outra das famílias, ou simplesmente um ramo aparentado da mesma), frutuosa para ambas as partes, terá ajudado à consolidação, crescimento e perpetuação das mesmas no terreno; Terão ainda ganho os membros da “família” da indústria bancária e da especulação imobiliária (provavelmente “parentes” próximos), porque continuaram a não ver colocada por ninguém a questão de que nunca seria necessária a construção de “habitação social” se, simplesmente, o acesso à compra de casa, não continuasse a ser tão obscenamente difícil;





- Finalmente, fica a enorme vantagem de que gozam os actos da “família”, quando são executados em termos de longo prazo, que é a inexistência de uma memória colectiva coesa ou bem formada que venha a julgar as acções dos seus membros perante a exploração do património de todos, para edificação apenas do seu próprio. O tempo tudo apaga e a lembrança dos povos é curta. Por isso é que a história se repete, recalcando velhos erros sobre os mesmos temas, cada vez mais desgastados, afundando cada vez mais o mundo num irremediável círculo de repetição e erro. Erros lucrativos, no entanto. Para a “família”, claro está. E já se sabe que no mundo, não há nada mais importante do que ela, a nossa família, por isso, “tudo está bem”.

O.José

3 comentários:

Ponto Verde disse...

Nada mais verdade caro josé a quem agradeço a colaboração, mas casos há no nosso país em que a ficção ultrapassa de longe a realidade.

Não sou adepto de teorias da conspiração, mas conhecendo vários casos com informação vinda de diversos lados acaba por ser evidente as teias "mafiosas" que se refere, assimiladas de uma forma escandalosa pela nossa cultura "TUGA".

Só um pequeno exemplo na Margem Sul. Enquanto a UE apela à participação da sociedade civil nas decisões comunitárias, as autarquias comunistas integram esta ideia de forma curiosa.

Sim senhor, apelam a grupos representativos da Comunidade, mas aqueles que são infiltrados pelo partido e influenciados no sentido de seguir a voz do dono, os outros realmente representantes da população e não ao serviço partidário, são uns proscritos, depois continuam a funcionar com um informador em cada quarteirão, um bufo em cada esquina seguindo fielmente a matilha...

Anónimo disse...

O visual dos gangsters tem-se degradado, da brilhantina de D.Corleone e descendentes para a barriga e fato de treino suburbano (mais proxima da nossa realidade) de Tony Soprano, pelo meio fica a luta solitária do Comissário Cattanni (uma realidade latina também próxima).

Só discordo por a famiglia ter entrado num processo de autofagia, não ha continuidade nos negócios da famiglia quando a actual geração perdeu o contolo e está insustentávelmente não só a dar cabo do ambiente,mas também impedindo que a futura geração betoneira tenha espaço para urbanizar!!!

Anónimo disse...

"Relatório: Portugal carece de meios para combater corrupção

As forças policiais portuguesas não têm meios para combater a corrupção, indica um relatório do Grupo de Estados contra a Corrupção, do Conselho da Europa, citado hoje pelo jornal Público.
O relatório sobre o combate ao crime económico relativo a Portugal, feito pelo Grupo de Estados contra a Corrupção (GRECO), do Conselho da Europa, foi tornado público na quarta-feira.

Nas conclusões do relatório, os peritos assinalam a «falta dos necessários meios materiais, financeiros e humanos e, por vezes, de treino, de forma a levar a cabo investigações aos bens e finanças», escreve o Público.

Desde 2002 foram iniciadas em Portugal 1.521 investigações, das quais 407 estavam completadas no momento em que a equipa do GRECO realizou a pesquisa.

Estas investigações foram levadas a cabo por 309 investigadores, 35 deles da brigada anticorrupção.

De acordo com o relatório, citado pelo Público, o número de apreensões e as somas envolvidas são «diminutas».

Em 2005, escreve o jornal, nem sequer tinha sido emitida qualquer ordem de confiscação, apesar de ser uma obrigatoriedade em casos de corrupção.

O grupo de peritos acrescenta que lhes foram explicadas as razões do insucesso: «Algumas vezes as investigações tiveram de ser abandonadas por falta de recursos ou por atrasos devido à comunicação inadequada entre certas agências públicas e privadas ou indivíduos».

Os peritos recomendam às autoridades portuguesas que sejam «revistas» as medidas de «identificação, apreensão e confiscação dos proveitos da corrupção» e que seja criada uma entidade especializada, responsável pela gestão de bens apreendidos.

O relatório aponta como causas para as falhas na confiscação a «falta de harmonia e ambiguidade das diversas fontes legais».

A equipa de avaliação recomenda também que «se recorra de forma sistemática à investigação dos bens e que todos os recursos - legais, técnicos e humanos - sejam usados ao máximo e, se necessário, reforçados de forma a tornar mais eficaz a investigação financeira».

De acordo com o Público, o relatório detectou também «fraquezas» na fiscalização das entidades jurídicas e denuncia ainda a «ausência de qualquer condenação desde 1984».

No relatório, as autoridades portuguesas são aconselhadas «a considerar a criação de um registo criminal para entidades jurídicas às quais tenham sido impostas sanções por ofensas corporais».

O GRECO é uma instituição do Conselho da Europa que envia periodicamente aos países-membros um grupo de peritos com a missão de avaliar o estado da corrupção.

A avaliação, refere o jornal, arrancou em 2003 sendo a segunda feita em Portugal.

Em Novembro do ano passado, a equipa de peritos esteve em Portugal, tendo-se encontrado com o ministro da Justiça, Alberto Costa.

Diário Digital / Lusa

25-05-2006 9:04:00 "