Excertos de um artigo de Luís Campos Ferreira, Correio da Manhã 16-08-11
Em 1983, o filósofo francês Gilles Lipovetsky escrevia no seu ensaio ‘A era do vazio’: "Os motins que se desenrolaram recentemente em Londres, Bristol, Liverpool, Brixton ilustram o novo perfil da violência. Se a revolta libertária dos anos sessenta era ainda ‘utópica’, portadora de valores, nos nossos dias, as violências que incendeiam os ghettos surgem desligadas de qualquer projecto histórico. Revolta pura da desocupação, do desemprego, do vazio social."
Estamos agora em pleno século XXI e o barulho das montras a estilhaçarem-se e as imagens dos saques nas ruas de Tottenham voltaram a sobressaltar a Europa. Os motins em Londres misturam hoje o vandalismo puro e duro com o assalto oportunista e selectivo e uma frustração colectiva e geracional que o velho continente já não consegue suster. Porque lutam estes jovens? Pelo emprego? Por comida? Pela liberdade? Ou pelo computador que lhes dê acesso às redes sociais? Estas pessoas roubam o que, no entender delas, o estado social tem obrigação de dar, desde as fraldas para os filhos até ao DVD de última geração.
Vivemos um tempo em que o Estado não pode pagar tudo, em que as marcas querem vender tudo, em que as pessoas não conseguem comprar tudo e os bancos já não emprestam dinheiro para nada. Este dominó comercial caiu e deixou a nu um facto: a tolerância à frustração material é quase nula nesta Europa onde o marketing é rei e as marcas são rainhas. Neste misto de histeria de roubo e arrastão de revolta, pouco ou nada há de ideológico, tão-só uma necessidade de querer ter. Os roubos e os actos de vandalismo são casos de polícia, mas evidenciam uma Europa cujo modelo social está em crise.
Foi esta Europa transformada numa feira de marcas e gadgets, da cultura do facilitismo e da hipervalorização do consumo que nos trouxe ao "shopping riot". A insegurança tem hoje múltiplas faces e os cidadãos sentem-se desprotegidos como há muito já não se sentiam. Perante acontecimentos como os de Londres, os Estados são forçados a fazer tudo ao mesmo tempo: reprimir, condenar, prevenir. E o mais difícil na voragem dos dias: reflectir sobre o que correu mal. Porque o risco é real: da Europa excessivamente económica e materialista podemos passar para a Europa insuportavelmente securitária.
1 comentário:
Existe de facto uma diferença nos comportamentos sociais que tem vindo a ser construída na base de ideias utópicas, onde o cidadão deve ter direito a uma estabilidade económica, social, cultural, assistência na saúde, mesmo que nada dê em troca à sociedade.
Até meados da década de setenta, a sociedade comparativa, trabalhava das 08:00 ás 17:00 e a desbunda era praticada ao fim-de-semana. Daí para cá, a deslocalização industrial para a Ásia, tem vindo paulatinamente a aprofundar-se e não é possível encaixar em termos profissionais toda esta gente; a solução foi, entornar dinheiro em cima do problema, esquecendo que a realização profissional é mais importante que o dinheiro fácil.
O ser humano tem necessidade de reconhecimento e o reconhecimento pelo trabalho é aquele que até hoje, mais contribui para a auto satisfação, retirando o trabalho, o que fica?, a necessidade de reconhecimento, esta necessidade precisa ser satisfeita.
Os governos ocidentais, têm vindo a entreter os cidadãos com medidas medíocres,( veja-se o limite de velocidade diminuído em Espanha de 120 para 110 km/h ),quando o desemprego já se contabilizava nos 20%, que significa isto?
Se as pessoas não conseguirem uma colocação profissional que lhes permita perseguir objectivos, que irão fazer a seguir?
O ócio é o pai de todos os vícios.
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