sexta-feira, março 02, 2012

A GERAÇÃO "I" DE INSUSTENTÁVEL





Está à rasca a geração dos pais que educaram os seus meninos numa abastança caprichosa, protegendo-os de dificuldades e escondendo-lhes as agruras da vida.

Está à rasca a geração dos filhos que nunca foram ensinados a lidar com frustrações.

A ironia de tudo isto é que os jovens que agora se dizem (e também estão) à rasca são os que mais tiveram tudo. Nunca nenhuma geração foi, como esta, tão privilegiada na sua infância e na sua adolescência. E nunca a sociedade exigiu tão pouco aos seus jovens como lhes tem sido exigido nos últimos anos.

Deslumbradas com a melhoria significativa das condições de vida, a minha geração e as seguintes (actualmente entre os 30 e os 50 anos) vingaram-se das dificuldades em que foram criadas, no antes ou no pós 1974, e quiseram dar aos seus filhos o melhor.

Ansiosos por sublimar as suas próprias frustrações, os pais investiram nos seus descendentes: proporcionaram-lhes os estudos que fazem deles a geração mais qualificada de sempre (já lá vamos...), mas também lhes deram uma vida desafogada, mimos e mordomias, entradas nos locais de diversão, cartas de condução e 1.º automóvel, depósitos de combustível cheios, dinheiro no bolso para que nada lhes faltasse. Mesmo quando as expectativas de primeiro emprego saíram goradas, a família continuou presente, a garantir aos filhos cama, mesa e roupa lavada.

Durante anos, acreditaram estes pais e estas mães estar a fazer o melhor; o dinheiro ia chegando para comprar (quase) tudo, quantas vezes em substituição de princípios e de uma educação para a qual não havia tempo, já que ele era todo para o trabalho, garante do ordenado com que se compra (quase) tudo. E éramos (quase) todos felizes.

Depois, veio a crise, o aumento do custo de vida, o desemprego, ... A vaquinha emagreceu, feneceu, secou.

Foi então que os pais ficaram à rasca.

Os pais à rasca não vão a um concerto, mas os seus rebentos enchem Pavilhões Atlânticos e festivais de música e bares e discotecas onde não se entra à borla nem se consome fiado.

Os pais à rasca deixaram de ir ao restaurante, para poderem continuar a pagar restaurante aos filhos, num país onde uma festa de aniversário de adolescente que se preza é no restaurante e vedada a pais.

São pais que contam os cêntimos para pagar à rasca as contas da água e da luz e do resto, e que abdicam dos seus pequenos prazeres para que os filhos não prescindam da internet de banda larga a alta velocidade, nem dos qualquercoisaphones ou pads, sempre de última geração.

São estes pais mesmo à rasca, que já não aguentam, que começam a ter de dizer "não". É um "não" que nunca ensinaram os filhos a ouvir, e que por isso eles não suportam, nem compreendem, porque eles têm direitos, porque eles têm necessidades, porque eles têm expectativas, porque lhes disseram que eles são muito bons e eles querem, e querem, querem o que já ninguém lhes pode dar!

A sociedade colhe assim hoje os frutos do que semeou durante pelo menos duas décadas.

Eis agora uma geração de pais impotentes e frustrados.

Eis agora uma geração jovem altamente qualificada, que andou muito por escolas e universidades mas que estudou pouco e que aprendeu e sabe na proporção do que estudou. Uma geração que colecciona diplomas com que o país lhes alimenta o ego insuflado, mas que são uma ilusão, pois correspondem a pouco conhecimento teórico e a duvidosa capacidade operacional.

Eis uma geração que vai a toda a parte, mas que não sabe estar em sítio nenhum. Uma geração que tem acesso a informação sem que isso signifique que é informada; uma geração dotada de trôpegas competências de leitura e interpretação da realidade em que se insere.

Eis uma geração habituada a comunicar por abreviaturas e frustrada por não poder abreviar do mesmo modo o caminho para o sucesso. Uma geração que deseja saltar as etapas da ascensão social à mesma velocidade que queimou etapas de crescimento. Uma geração que distingue mal a diferença entre emprego e trabalho, ambicionando mais aquele do que este, num tempo em que nem um nem outro abundam.

Eis uma geração que, de repente, se apercebeu que não manda no mundo como mandou nos pais e que agora quer ditar regras à sociedade como as foi ditando à escola, alarvemente e sem maneiras.

Eis uma geração tão habituada ao muito e ao supérfluo que o pouco não lhe chega e o acessório se lhe tornou indispensável.

Eis uma geração consumista, insaciável e completamente desorientada.

Eis uma geração preparadinha para ser arrastada, para servir de montada a quem é exímio na arte de cavalgar demagogicamente sobre o desespero alheio.

Há talento e cultura e capacidade e competência e solidariedade e inteligência nesta geração?

Claro que há. Conheço uns bons e valentes punhados de exemplos!

Os jovens que detêm estas capacidades-características não encaixam no retrato colectivo, pouco se identificam com os seus contemporâneos, e nem são esses que se queixam assim (embora estejam à rasca, como todos nós).

Chego a ter a impressão de que, se alguns jovens mais inflamados pudessem, atirariam ao tapete os seus contemporâneos que trabalham bem, os que são empreendedores, os que conseguem bons resultados académicos, porque, que inveja! que chatice!, são betinhos, cromos que só estorvam os outros (como se viu no último Prós e Contras) e, oh, injustiça!, já estão a ser capazes de abarbatar bons ordenados e a subir na vida.

E nós, os mais velhos, estaremos em vias de ser caçados à entrada dos nossos locais de trabalho, para deixarmos livres os invejados lugares a que alguns acham ter direito e que pelos vistos - e a acreditar no que ultimamente ouvimos de algumas almas - ocupamos injusta, imerecida e indevidamente?!!!

Novos e velhos, todos estamos à rasca.

Apesar do tom desta minha prosa, o que eu tenho mesmo é pena destes jovens.

Tudo o que atrás escrevi serve apenas para demonstrar a minha firme convicção de que a culpa não é deles.

A culpa de tudo isto é nossa, que não soubemos formar nem educar, nem fazer melhor, mas é uma culpa que morre solteira, porque é de todos, e a sociedade não consegue, não quer, não pode assumi-la. Curiosamente, não é desta culpa maior que os jovens agora nos acusam.

Haverá mais triste prova do nosso falhanço?

Mia Couto

11 comentários:

Paulo Edson Cunha disse...

Concordo em absoluto!

soliveira disse...

“Os nossos jovens gostam do luxo e são mal-educados, não respeitam as autoridades e não têm o menor respeito pelos mais velhos. Os nossos filhos hoje são uns verdadeiros tiranos. Não se levantam quando entra um ancião. Respondem aos pais e são simplesmente maus”.

"socrates 470-399 aC"

Que novidade.
O pormenor é que o autor fala sempre 'neles', como quem afirma que; os meus não, os meus são diferentes e embora lhes dê tudo o que merecem, são responsáveis e dão o valor ás coisas.
Já ouvi e li este tipo de criticas muitas vezes, mas é sempre sobre eles, eles, eles...

Anónimo disse...

... ou talvez nos recusemos sempre a olhar os assuntos, e procuremos uma não solução!
Se não se é contra a forma ...é-se contra o conteúdo, ou vice-versa.
Optar pela via desculpabilizante para que continue tudo na mesma.
Citaria o filósofo Fernando Savater, que pensa que o grande problema da democracia é «a predominância generalizada da maré de ignorância» e a educação cívica é única melhor forma de a combater. «Na democracia, toda a educação cívica é uma escola de príncipes, embora destinada a formar príncipes que, paradoxalmente, devem saber-se inter pares e não acima deles»,

Ponto Verde disse...

Obrigado pelos anteriores comentários, mas eu nem aprofundo tanto, até porque o texto diz tudo, acho tudo isto um reflexo da espiral de consumo em que entrámos, considerando a capacidade de consumir perante os outros o expoente máximo da realização da geração paterna a que o texto refere .

Essa geração , foi já ela mal mimada , e já ela teve menos acompanhamento em casa e contacto com várias gerações que constituem uma família do que as anteriores .

Agora, depois de demonstrar o seu sucesso com os carros, com as casas, com as férias, com as idas à neve... (tudo comprado acima das possibilidades) , a cereja no topo do bolo é qual vai ser o primeiro do grupo de amigos ou da família a dar a carta ou o carro ao rebento que em casa já tem TUDO e que em vez de participar na vida da familia se barrica no quarto dia e noite à espera do room-service.

Agora que caímos todos ( excepto alguns autarcas) na realidade , que se extinguem cargos e postos de trabalho à velocidade de uma assinatura num qualquer despacho e que os meninos continuam a exigir a dolce-vita , é que a porca torce o rabo.

Já nos esquecemos , mas há uns anos recebemos uma geraçõ ultra qualificada de emigrantes na casa dos vinte e tal trinta anos vindos dos países do leste , estes tinham uma vantagem em relação aos nossos de hoje, tinham atrás de si não uma cultura de ócio , de falta de disciplina, e de rabos sentados ao computador ou playstations, mas a capacidade de fazer de TUDO !

E mais não digo, mas nas costas deles que agora partem, vejo as dos que por cá só se queixam.

Anónimo disse...

por vezes não damos muita importância a este ou àquele pormenor, mas lá se vão juntando lentamente as peças e construindo o cenário do que era , e aquilo que hoje é Portugal .
Começemos por dar uma vista de olhos Portugal pelo olhar de Ferreira de Castro, que não é assim tão longíquo como isso! Como é então o cenário que se depara? Resposta: mesmo que péssimisticamente nos situemos na cauda da europa, o paìs muda da idade média para pelo menos uma nova era.
Navegava eu pelo distrito de Setubal, quando sem qualquer dúvida afirmava a qualquer dos diversos interlocutores com que depara:
-que tinham filhos formados , filhos” senhores doutores”.
-que todos eles tinham ido para a escola descalços.
-que todos eles estavão desiludidos com o 25 de Abril.
Sintéticamente, se não houve uma revolução, se uma mudança destas em 30 anos não tem como significado uma revolução, vou pensar melhor sobre o assunto, e verificar se não preciso de aferir melhor os meus valores.
E falando de valores, a massificação da educação, a migração das populações rurais para as periferias, não terão por acaso pesado no diluir dos valores da classe média ; o que conhecemos por principios que não fossem os da “mulher a dias a todo o custo ter o direito de querer a filha professora doutora”; por acaso não se criou uma classe que não só não absorveu a cultura da classe média, mas também renegou a cultura e os valores dos progenitores, relegados a labregos; essa classe que se tornou predominante na sociedade portuguesa, a sociedade de direitos, tendo o umbigo como o alcance máximo de visão da cidadania; o que poderiam ter de bom renegaram, a massificação deu-lhes conhecimentos nesta ou naquela matéria, não lhes deu cultura nem à pressa lhes poderia dar; o que poderiam transmitir aos vindoros...ou a revolução tem um preço que teremos de saber pagar

Anónimo disse...

Mia Couto está no seu texto a branquear as causas do estado a que chegaram as vidas dos pais e dos jovens. Porque com estes culpados (pais) ficaram de foram os verdadeiros culpados (os politicos) que gastaram todo o produto de impostos dos trabalhadores deste país em 36 anos. Gastaram desgovernadamente compraram votos viajaram fizeram fortuna, deixaram o país chegar ao caos, caos esse que lhe dava jeito para a sua politica rasteira e desonesta. É interessante ver jovens concordarem com este texto quando esses jovens estão apadrinhados pela politica. Os pais têm uma culpa, assim como os jovens a terão daqui para a frente de não terem controlado os politicos , não lhes terem exigido rigor, honestidade, respeito, não terem exercido o seu direito de cidadania e terem dado mais atenção aos orçamentos do governo e das autarquias para verem como era gasto o dinheiro que recebiam dos impostos de gente que trabalhou toda a vida e pagou os seus impostos muitas vezes com muito sacrifício. Os pais não tiveram muita cultura democratica e não souberam fazer valer os seus direitos de cidadania, mas os jovens que agora estudam e têm uma melhor preparação para perceberem tudo o que à sua volta se passa, são a esperança para acabarem com a festa dos politicos e pelo desrespeito que têm tido por toda a gente até por quem os elege. Os pais deram tudo aos filhos ontem, hoje como sempre foi assim. Em todos os tempos os pais fizeram o melhor pelos seus filhos.Quando imigravam era a pensar nos seus filhos, quando trabalhavam vários turnos era a pensar nos seus filhos. Sempre fizeram de tudo para os seus filhos estudassem, nas escolas que existiam nos seminários isto para lhes dar uma vida melhor. Antes e muito antes do 25 de Abril foi assim e assim continuará a ser enquanto houver pais normais. Os nossos jovens não são hoje aquela amalgama de gente inculta, bem pelo contrário são muito bem preparados apenas não há neste país igualdade de oportunidades como toda a gente sabe. Quanto à saida dos mais velhos para deixar o lugar para os novos mia couto esqueceu-se de dizer que há na nossa sociedade hoje pessoas com 50 empregos, politicos reformados várias vezes e ainda a exercer, autarcas reformados a exercer em lugares de assessores. Os pais não vão ao concerto não é porque os filhos vão é porque têm de pagar os concertos dos politicos os ordenados dos politicos as viagens dos politicos, as reformas dos politicos, as contratações duvidosas milionárias pelos politicos, os subsidios aos partidos. E quando os politicos querem mais dinheiro aumentam os impostos e não se preocupam nada em saber como vai nem a vida dos pais nem a vida dos filhos. Não tenciono gastar mais um tostão que seja em livros de Mia Couto.

Anónimo disse...

Culpar os políticos da total dispensa do papel educativo dos pais é prova de uma profunda estupidez, e de tentativa de atirar poeira para os olhos.

Os pais de hoje pensam que são os professores que têm de ensinar e educar.
Eles, os pais, só estão lá para dar aos meninos o que eles querem, que são os melhores do mundo.
Para lhes pagar a universidade, mesmo que não estudem, a discoteca, mesmo que sejam menores, os telemóveis, se bem que so os usem para mandar sms aos amigos sentados ao seu lado.

Sim, a culpa da falta de humildade, de respeito, de vontade de trabalhar, é toda dos políticos.

Sim, a culpa de não ensinar a dizer obrigado, por favor e desculpe é toda dos políticos.

Anónimo disse...

Os politicos não gostam das verdades. É pena um pouco de humildade para reconhecer os erros não lhe ficava nada mal.

Anónimo disse...

A intolerância como manifestação de ignorância dificilmente nos levará por algum caminho.
Talvez tenhamos que nos afundar um pouco mais, para compreendermos que existe mundo, para além do nosso umbigo.
Será que as exigências que fazemos aos outros, as fazemos a nós próprios?
Não serão os outros, ou mesmo nós próprios, o resultado das exigências que não formulámos nem soubemos formular.
Ou continuamos a querer acreditar que a democracia se estabelece por decreto...e que é a "nossa"!

Anónimo disse...

Os politicos, então os locais o que deram a estea suma geração foi medalhas nas Seixalíadas premear o corpo são depois de tão árduo esforço na sua formação académica onde têm que vencer praxes, tascas, bebedeiras a esmo e queima de neurónios (perdão de fitas).

E muito os politicos comunistas fizeram , os toca no bombo, as festas todo o ano, os concertos grátis e os pagantes na Festa do Partido. Venham e reivindiquem na época da abundância, venham à mnargem certa e comprem apartamento com vista para o mar em magnificos condominios à beira tejo plantados.

E agora que secou o crédito que tudo enganava, desde as contas das autarquias às contas do supermercado, quando já nem ir ao Tota resolve, é de volta à casa dos papás que os vêmos, alguns com prole ainda mais malcriada e intolerante que eles mesmos, verdadeiros TUGAS , Gimbras. ou melhor MITRAS.

Anónimo disse...

Comentador da 1.11 que tal mandar o Mia Couto para a Sibéria e fazer um auto de fé com os seus livros frente ao verdadeiro símbolo do poder local reivindicário e de culto da cidadanis, o Multiserviços da Câmara do Seixal arrendado ao A.Silva & Silva e pago sabe por quem ?