terça-feira, julho 28, 2009

CORRUPÇÃO EM PORTUGAL (7)


No OPS ! A Arquitecta Helena Roseta escreve sobre "Especulação e Democracia" (link) , cito (excertos) :

1. Moeda e cidade, escreveu Fernand Braudel, são os dois principais multiplicadores do capitalismo. O mercado financeiro e o imobiliário andam sempre juntos. (...)

Uma das causas imediatas do colapso financeiro cujas consequências catastróficas estamos a sofrer residiu, como sabemos, no mercado de hipotecas nos EUA. Está à vista o resultado desastroso (...)

2. O capital pode multiplicar-se indefinidamente. Mas enquanto novos produtos virtuais ampliam constantemente os circuitos financeiros, com o território, que não é infinito nem pode crescer ilimitadamente, o processo é outro. A concentração urbana associada à concentração financeira altera a forma física das cidades e produz situações de poluição e saturação que em certos casos atingem todo o planeta.


3. Em Portugal, durante décadas, os poderes públicos demitiram-se de fazer cidade. O território foi entregue aos loteamentos particulares, que cresceram nos terrenos livres à volta das cidades ou perto de novas acessibilidades. O nosso país está cheio de “urbanizações sem urbanismo”, resultado do livre jogo do mercado de solos, loteados legal ou clandestinamente, quase sempre na ausência ou contrariando instrumentos de ordenamento do território de escala mais geral. Só na década de 90 se generalizou a cobertura do país por Planos Directores Municipais (PDM), mas sem que nenhum instrumento forte de política de solos lhes fosse associado.

Uma análise das formas urbanas que assim surgiram em todo o país mostra que, em matéria de espaços públicos e de implantação dos edifícios, não são muito grandes as diferenças entre as urbanizações legais e as clandestinas.

Apesar de se dirigirem a faixas distintas do mercado habitacional, umas e outras obedeceram à regra da maximização do lucro, descurando a mistura de funções que separa a cidade tradicional das “fast-cities” onde só se vai para dormir. Aparecem no território sem qualquer respeito pelos valores paisagísticos, ocupando integralmente os limites da propriedade “urbanizada” que lhes deu origem. Não se articulam com o território à sua volta nem com a cidade existente. Os novos modelos de condomínio fechado prosseguem a mesma lógica. Há maior cuidado com o espaço exterior, mas ele é todo privatizado, fazendo desse segmento do mercado, destinado às classes mais altas, uma espécie de “guetos inversos”. (...)

3. Ao fim de muitos anos de contacto com a actividade urbanística e autárquica em Portugal, chego à conclusão de que os planos têm servido, sobretudo, para reforçar os mecanismos ultra-liberais da economia de mercado. É para valorizar terrenos que se continuam a fazer planos. (...)

Mas o mercado de solos é um mercado escasso. Não é possível expandi-lo ilimitadamente, sob pena de desastre ecológico. O ambiente, a paisagem e o património cultural são valores colectivos que nem sequer pertencem a uma só geração. Uma vez destruídos, são irrecuperáveis.


4. São as autarquias que detêm o poder de licenciamento, que é no fundo um poder equivalente ao da emissão de moeda. De cada vez que se autoriza uma dada quantidade de metros quadrados de construção, está-se a emitir moeda. É este o grande instrumento do chamado “lóbi do betão”, que talvez devesse chamar-se antes “lóbi do cifrão”, porque é disso que se trata. Estes metros quadrados de construção, muito antes de se transformarem em qualquer coisa de físico e visível, são transaccionados e multiplicados, mobilizando o sector financeiro e parafinanceiro.

5. (...) É nos Planos Directores Municipais (PDM) que se estabelece a distinção entre solos rústicos e solos urbanos ou urbanizáveis. A diferença não é só de nome, é de valor. Os solos urbanos ou urbanizáveis valem muitas vezes mais do que os rústicos, precisamente porque neles actua a tal “nova moeda”
(...)

6. 6. O que rende milhões não é tanto, como vulgarmente se pensa, a construção civil, que é a fase final e visível do processo, mas sim a transformação do solo, que resulta de três vias: a classificação de um solo rústico como urbano ou urbanizável; a mudança de usos (uma zona verde que passa a ser para habitação, um espaço de equipamentos que é transformado em escritórios, uma praça pública que se “privatiza” para um centro comercial, etc.); e o aumento dos índices de ocupação muito para lá do razoável, através do aumento do número de pisos ou da volumetria. São estes os três caminhos que pressionam os decisores e os técnicos e que constituem o dia-a-dia da gestão urbanística nas autarquias. (...)

7. Em apenas 15 anos, o “território artificializado”, ou seja, o território rústico que foi construído (e que inclui tecido urbano, transportes, grandes equipamentos industriais e comerciais e áreas ainda em construção) cresceu 42,2 por cento em Portugal continental, num total de cerca de 70 mil hectares. O aumento fez-se à custa dos outros usos: perderam-se 21 mil hectares de floresta, 33 mil de solo agrícola, 12 mil de solos agrícolas com áreas naturais e 4 mil de vegetação natural.


8. Compreendemos melhor agora onde está o grande poder das autarquias, dos directores de urbanismo, das entidades públicas. É aqui que tem de ser feito um grande esforço para combater promiscuidades, melhorar a lei e aumentar o escrutínio democrático e mediático (...)

É por aqui que tem de passar o combate à corrupção. Uma forma de corrupção que se faz muitas vezes pela calada, no sossego dos gabinetes, sem escândalos mediáticos e sem conhecimento do público. Só quando tudo aparece construído (o que pode levar anos ou décadas) é que os cidadãos percebem que algo está mal. Mas nessa altura os erros são irrecuperáveis e os seus beneficiários já deram à sola.

9. Que fazer, então?

É preciso aumentar a consciência social sobre o abuso urbanístico. O nosso território e as nossas cidades são bens inestimáveis que temos de legar às gerações seguintes sem delapidação. Temos de combater um modelo de crescimento urbano que se alimenta da desregulação e da apropriação privada das mais-valias urbanísticas.

O Estado e as autarquias têm de voltar a assumir um papel regulador e urbanizador que nunca devia ter saído da esfera pública. “Fazer cidade” tem de ser obra colectiva e não privilégio de alguns.

É urgente aumentar o escrutínio dos cidadãos, defendendo aquilo a que chamo “urbanismo participativo” e que passa pela transparência das decisões administrativas e autárquicas e pelo acesso on-line à informação urbanística e cadastral.


8 comentários:

O Anti Lampião disse...

NEGÓCIOS ESTRANHOS

Alguma coisa está podre quando um clube

GRAÇA ROSENDO vem da escola do jornalismo de investigação do extinto «Independente» (o bom, porque também houve o mau), o que quer dizer que não é propriamente uma menina recém-chegada ao jornalismo, disposta a escrever qualquer coisa que o director lhe diga que faz vender jornais. Assim, a peça que ela escreveu no penúltimo número do «Sol», sobre as dívidas do Benfica à Euroárea decorrentes da construção do centro de treinos do Seixal, é história que merece ser analisada mais de perto. Aliás, o artigo que logo se seguiu sobre o assunto, aqui, na «Bola», e a reacção do porta-voz da Luz, demonstraram bem que o tema gera bastante desconforto.

Desde logo, salta à vista o facto de, no conjunto de uma dívida cujo total chega aos 24,5 milhões de euros, o Benfica ter já falhado a primeira prestação, de apenas 2,5 milhões, titulada por uma letra de que é avalista. E se falhou o pagamento desses 2,5 milhões, como honrará, em Setembro, o pagamento dessa quantia mais os 22 milhões que então se vencem? A segunda coisa que não pode deixar de preocupar alguns benfiquistas é pensar que esses 24,5 milhões representam o dobro daquilo que efectivamente era devido, mas que a falta de cumprimento contratual por parte do clube fez accionar a cláusula penal do contrato — a qual previa exactamente a duplicação do montante em dívida. E também deve dar que pensar que esses 24,5 milhões representem exactamente aquilo que o clube já gastou em contratações para a próxima época e representem também o total do orçamento do futebol para a época agora iniciada — e de onde tal dívida não consta orçamentada.

Mas isso são preocupações dos sócios benfiquistas, se as quiserem ter. E a verdade é que os sócios benfiquistas, que votaram maciçamente em Luís Filipe Viera há poucas semanas, ouviram-no dizer na campanha eleitoral que não lhe falassem do défice, se queriam ter uma equipa de futebol competitiva. E há poucos dias, os sócios benfiquistas desertaram também maciçamente a Assembleia Geral onde as contas e o orçamento do próximo ano foram aprovados. A mim, as dívidas do Benfica não me interessam nem me ocupam — excepto se, como também se pode inferir da notícia de o «Sol», elas vierem a ser cobertas, no todo ou em parte, pela Caixa Geral de Depósitos, porque aí já são os dinheiros públicos que entram em cena e julgaria inaceitável que o banco do Estado andasse a financiar um clube que, em lugar de pagar dívidas, compra jogadores. Mas, tirando essa situação, o que me preocupa, e tem ocupado aqui bastas vezes, são as contas e as compras do FC Porto.

Porém, se venho a este tema, é porque há, na peça da Graça Rosendo, uma parte que me fez disparar uma campainha de alarme. Como é que a direcção da SAD do Benfica, presidida então, como agora, por Vieira, se propôs pagar à Euroárea os custos da compra do terreno e construção do centro do Seixal? Em dinheiro, em partilha de receitas, em direitos de exploração? Não: propôs-se pagar em forma de tráfico de influências políticas. É isso mesmo que se infere do contrato assinado entre ambas as partes. O Benfica propôs à Euroárea cumprir a sua parte do contrato obtendo da CML a autorização para mais 1 800 metros quadrados de construção a favor da Euroárea na urbanização dos terrenos da Luz, e obter da CM Seixal idêntica licença para ampliação em 30 000 metros quadrados da urbanização na Quinta da Trindade, no Seixal, de que esta empresa é proprietária.

O Anti Lampião disse...

Ou seja: o Benfica propôs-se servir de intermediário da Euroárea e junto das edilidades de Lisboa e do Seixal, a favor dos interesses da empresa. E se o fez, e se a Euroárea o aceitou, é logicamente porque a empresa concluiu que, por si só, não conseguiria convencer as autarquias a reverem e revogarem os planos municipais já aprovados. A Euroárea reconheceu não ter força de influência política para o conseguir; mas reconheceu também que o Benfica a tinha. E foi com este pressuposto que assinaram o contrato. Estamos perante um chocante caso de tráfico de influências, feito por um clube de futebol a favor de uma empresa privada e nos interesses de ambos. A força da «marca Benfica», como costumam dizer, é de tal ordem, que a direcção presidida por Luís Filipe Viera não hesita em assinar contratos onde se compromete a obter de autarquias regimes de excepção a favor de terceiros!

Em tempos, e perante o silêncio geral, expus aqui detalhadamente o que foram os extraordinários contratos de favor celebrados entre Benfica e Sporting, por um lado, e a CML, então presidida por Santana Lopes, por outro, e que permitiram a construção dos novos Estádios da Luz e Alvalade XXI. Já lá vão cinco anos e recordo apenas que, entre várias facilidades de construção excepcionais e outras alcavalas, a CML (eternamente arruinada) deu, literalmente dado e em «cash», 15 milhões de euros a cada clube. O contrato era de tal forma impressionante que a última cláusula estabelecia (ó santa inocência!) que nos próximos dez anos nenhum dos dois clubes teria mais o que quer que fosse da CML. O Sporting conseguiu recentemente que um tribunal arbitral, aceite pela CML, lhe outorgasse mais uns direitos de construção extra em terrenos tão próximos do estádio que basta olhar para a sua localização para perceber o regime de favor e excepção de que beneficiou. E o Benfica, pelos vistos, ainda se reserva o direito de obter o mesmo, directamente a favor de terceiro. E pensar que, depois do grande regabofe entre câmaras e clubes a pretexto do Euro-2004, o único «escândalo» que ocupou a imprensa e o Ministério Público foi a permuta de terrenos entre o FC Porto e a CMP! Ao menos o FC Porto, quando se abalançou à construção do Estádio do Dragão, era proprietário de 17 hectares de terrenos na zona, livres e disponíveis. Quantos tinham Benfica e Sporting?

VOLTANDO ao contrato entre Benfica e Euroárea, o que parece ter complicado a posição contratual do Benfica é que, por um lado, a CM Seixal ainda não outorgou a tempo o alvará a favor da Euroárea que o Benfica se comprometeu a obter, e a CM Lisboa levou a expansão da área de construção da Luz a votação camarária e o projecto não passou. Houve uma votação que terminou empatada 5-5 e o presidente e benfiquista António Costa fez uma prévia declaração prescindindo do seu voto de qualidade. O Benfica já juntou o inevitável parecer jurídico, sustentando que o presidente, quando vota, tem sempre voto de qualidade (e devo dizer que, juridicamente, também acho o mesmo). Mas, no mínimo, o que António Costa deveria ter feito era abster-se na votação, ou, melhor e mais normal, ter recusado liminarmente o projecto porque cidade alguma pode ser governada com decisões de excepção a favor de clubes de futebol que vivem eternamente acima dos meios normais de que dispõem. Chama-se a isso fomentar a concorrência desleal e chama-se a isso dispor de coisa pública em benefício de interesses particulares.

Depois não venham dizer que o futebol é um mundo à parte. Alguma coisa está podre quando um clube assina contratos em que se compromete a obter junto das autarquias autorizações de construção a favor de terceiros.

mais em
http://www.oantilampiao.blogspot.com/

Pedro Afonso disse...

Alguém sabe do candidato do PS a Fernão Ferro? Nas festas populares dessa freguesia, o candidato do PS não deu sinal de vida. Terá vergonha do PS ou é o PS que tem vergonha dele?

Bombeiro Voluntário da Amora disse...

O antilampião vem aqui revelar um tema com interesse a explorar. entretanto os centuriões de serviço não aguentaram a pedalada , estarão com gripe ?

Anónimo disse...

Caro Bombeiro, devem estar no Centro de Trabalho a comer caracóis e a fazer um post.
TODOS JUNTOS!!!
TODOS JUNTOS!!!
E UM POST BRILHARÁ PRA TODOS NÓS!!!!

Anónimo disse...

Pela parte que me "toca", estou apenas a "vêr" as moscas a poisar na me...!

ou se preferirem,

estou no "balcão" a vêr o espectáculo!

Escolham e masturbem-se!

Anónimo disse...

Porque será que a oposição não explora politicamente essas negociatas obscuras do Benfica-Euroárea-CMS? Será que todos foram coniventes porque se tratava do Benfica de que alguns são sócios ou simpatizantes?

Anónimo disse...

Não se percebe de maneira nenhuma que a oposição não queira aprofundar como é que a Camara dum loteamento que tinha alvará emitido para 600 fogos e estava caducado porque as obras nunca foram feitas e a camara retirou o alvará ao proprietário anterior e depois com a euroarea foi emitido alteração a um alvará caducado que é como se não existisse logo uma coisa que não existe não pode ser alterada mas essa alteração foi feita e de 600 fogos passou par 1200 sem alteração do PDM. OS SENHORES VEREADORES DA OPOSIÇÃO SÃO NALGUNS CASOS ADVOGADOS SABEM MUITO BEM QUE ISTO É ILEGAL E INDICIA CORRUPÇÃO E PORQUE É QUE NÃO FIZERAM NADA? Será que neste pais os PDM têm um indice para as euroareas e outro para o cidadão comum?